terça-feira, 31 de março de 2009

SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

1. Fragmentação Familiar

Observando a repetição de fotos com foco nas crianças sozinhas, por vezes até suge-rindo uma precoce atividade de responsabilidade adulta, outras vezes brincando com muitas outras crianças e adolescentes isolados de outros adultos, há fortes indícios de que Doisneau tinha uma intenção específica, compondo lúdica e ironicamente uma imagem poética de uma realidade de tempos bastante delicados para a estrutura familiar e sociedade de Paris daquela época.
Após o estouro da guerra, Paris era “cidade aberta”, abandonada pelo próprio governo francês, o povo francês estava dividido nos que apoiavam a entrada dos nazistas, a elite fran-cesa, pois havia o interesse financeiro e estabilidade. E havia a chamada “resistência”, grupos formados por diversas classes sociais e agrupamentos políticos, entre eles, homens, mulheres e jovens, oficiais do desmembrado exército francês, civis organizados em grupos de assalto, sinaleiros, Serviço Secreto de Informação e engenheiros.

Conforme Girard (1945 apud Segunda Guerra Mundial – Ultra Secreto – Seleções do Reader´s Digest, 1965, p. 41) contextualiza:

A organização teve início quando milhares de civis e ex-soldados se atropelavam pelas estradas que levam ao Sul da França, fugindo ao avanço das legiões germânicas. As famílias fragmen-tavam-se; os jornais estavam cheios de anúncios, à procura de pessoas perdidas: “Urgente! Se alguém viu o meu irmão Charles Pittigny, que viajava pela estrada de Chartres, favor informar à caixa número...

A resistência tinha objetivos bem delimitados e organizados, e uma das tarefas mais difíceis era reprimir os atos de vingança pessoal contra nazista sem importância ou influência.

Segundo Girard (1945 apud Segunda Guerra Mundial – Ultra Secreto – Seleções do Reader´s Digest, 1965, p. 43) nos revela:

Certo agricultor enterrou, nos campos de morangos da sua propriedade, oito alemães que havia estrangulado porque mataram sua filha. Dessa forma, centenas de alemães foram mortos, mas também centenas de franceses executados por represália.

Além da fragmentação familiar devido a acidentes, desaparecimentos em meio ao caos do fluxo de pessoas, e aos que eram chamados ou iam por vontade própria unir-se aos grupos de resistência franceses, havia uma fragmentação ainda mais pesada em relação às famílias judias. Em contrapartida, muitas pessoas, em sua maioria pertencente a organizações religio-sas não só se comoveram com a situação como de fato concretizaram grandes obras de solida-riedade para com as crianças.
Conforme Kent (1945 apud Segunda Guerra Mundial – Ultra Secreto – Seleções do Reader´s Digest, 1965, p.210) afirma:

No começo de 1942 o governo de Vichy mandou aliciar alguns milhares de judeus, e expediu-os para a Alemanha. Em Lion, onde vivia esse padre, homens e mulheres, ao serem deportados, foram forçados a abandonar os filhos, num total de 120. O Padre Chaillet começou imediata-mente a reunir essas crianças. Foi achar quatro delas, meio mortas de fome e de medo, num po-rão; outras doze foram pescadas nas ruas; trinta estavam encurraladas num quartel onde a polí-cia as metera: foi buscá-las.

Decorrente dessa situação havia um grande número de crianças órfãs, porém, esse nú-mero foi bastante reduzido graças a ações como a do Padre Chaillet, que registrava e guardava em local seguro as identificações das crianças, além de conseguir confiar a guarda de crianças a muitas famílias de camponeses e instituições religiosas, que raramente se negavam a ajudar.
Ainda segundo Kent (1945 apud Segunda Guerra Mundial – Ultra Secreto – Seleções do Reader´s Digest, 1965, p.210):

[...] Pôs-se então em um campo para organizar metodicamente à maneira de livrar os inocentes das garras do nazismo, de tal forma que após a guerra eles pudessem voltar a juntar-se aos pais...
Podemos concluir então, que um dos reflexos mais marcantes da Segunda Guerra Mundial na sociedade parisiense foi a fragmentação familiar, onde a estrutura original das famílias foram quebradas e reconstruídas de outra maneira, seja em orfanatos ou em outras casas de famílias, as crianças tiveram uma mudança drástica em suas vidas, seja pelo contexto triste de perda, o clima tenso e a violência da guerra, o trabalho e a responsabilidade precoce sobre si mesmas e sobre outras crianças.

2. A Criança como Protagonista da Crítica/Denúncia de Doisneau

De acordo com o jornal Folha de São Paulo, Willy Ronis e Robert Doisneau foram os principais fotógrafos da época que retrataram a sensibilidade escondida no cotidiano da socie-dade parisiense como verdadeiros protagonistas. Simultaneamente, Henri Cartier-Bresson, registrou o "instante decisivo" na vida urbana do inicio da década de 30 de uma forma mais lúdica. Desses fotógrafos Willy Ronis e Robert Doisneau registravam a dignidade humana e as consequências que a guerra causou às famílias. Eles personificam a liberdade, a “carne sem pecado”.
Robert Doisneau durante a ocupação alemã colaborou com a Resistência e, em 1944, registrou a libertação de Paris, em cuja campanha conheceu Henri Cartier-Bresson.Willy Ro-nis captou a Paris mais popular e o mundo trabalhador e, assim como Robert Doisneau, rela-tou através das suas fotografias a preocupação com o ser humano e sofrimento por eles vivi-do.
Encontramos alguns elementos incutidos nas fotos de Robert Doisneau, relacionadas ao nosso recorte. As crianças parisienses como protagonistas, sozinhas e responsáveis por si.
Segundo ABRAHAM (1997) “Só na França morreram 211,000 militares franceses e na média de 88,000 civis”. Muitos destes que morreram eram pais, outros foram convocados para a resposta militar a Hitler; o resultado disso é uma grande quantidade de crianças sem a presença paterna ou materna. Há certa crítica e denuncia dentre as fotos de Doisneau, que por outro lado são românticas e poéticas.
Independente das crianças estarem passando por um momento de violência, gerada pe-la guerra, muitas não possuíam discernimento para realmente entender o que acontecia; po-dendo assim fazer com que Doisneau retratasse a magia da infância em meio a escombros e solidão. O aspecto da inocência infantil tornou as fotos de Doisneau ainda mais interessantes, lúdicas e eternas.

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